domingo, 27 de outubro de 2013

Programas de Índio ou como aprender a sonhar com um mundo diferente...

     Um programa interessante que fizemos com as crianças, no fim de semana do "Dia das Crianças", me inspirou a escrever esse post.

    Fomos visitar uma exposição da Organização "Médicos sem Fronteiras", pela qual eu tenho uma enorme admiração, sobre a realidade dos campos de refugiados no mundo.


    Poxa, mas levar criança num negócio desses? Bem, como era uma exposição interativa, achei que poderia ser legal e diferente para as crianças. E também faz parte da pauta do meu "currículo" de educação de filhos tentar, pelo menos quando é possível, fazer com que eles vivenciem realidades diferentes, para aprenderem a lidar com o outro sem discriminação ou preconceito. Ah, também faz parte do currículo tentar mostrar e envolvê-los na dor do outro. 
     Mega ambiciosas essas minhas pretensões, não? Eu sei, mas não custa tentar, não é mesmo?

     Vamos então à exposição. Foi num parque lindo do Rio de Janeiro, chamado Parque Lage, aos pés do Cristo Redentor. 
     Numa área ao ar livre foi montada toda a estrutura, simulando um campo de refugiados. Um campo que poderia estar no Sudão, no Líbano ou em qualquer bolsão de exclusão do mundo.


     Quando chegamos, recebemos um papel com a identidade de um refugiado. Durante o percurso seriamos solicitados a ler o que a nossa identidade dizia e imaginarmos como aquela pessoa vivia, sentia, sofria... Eu seria uma mulher da Somália, com 08 filhos que fugira para o campo buscando ajuda para um dos filhos prestes a morrer de desnutrição. Meus filhos também receberam identidades de crianças refugiadas. 
A identidade que o Pedro recebeu, de uma criança malinesa

     Passávamos então por um circuito simulado, o mesmo que um refugiado passaria ao chegar ao campo fugido da guerra ou buscando ajuda para tratamentos de saúde. 

     A primeira parada era para conhecermos as moradias. Se é que uma barraca minúscula, que acomodaria até 8 pessoas e um choupana de gravetos podem ser chamados de moradia... O Pedro olhou, entrou e saiu das barracas, parecia que a impressão dele era que eram de brincadeira. Claro, é um referencial de vida muuuito diferente do que a gente vive, difícil uma criança como as nossas acreditar que alguém pode morar daquele jeito.




Arranjou um amigo e já aproveitou para descansar do calor escaldante do Rio dentro da barraca, rs

     Passávamos então para os banheiros. No bom sentido né, chamar buracos no chão de banheiro. O mais interessante era que os médicos, engenheiros, e psicólogos da organização é que nos apresentavam tudo, então podíamos perguntar, ouvir exemplos e testemunhos impactantes deles!

     A parte propriamente dos " ambulatórios" era muito interessante. Pensar que alguém poderia ficar ali, naquela tenda abafada, num calor de 45 graus do deserto, já servia para a gente pensar na doação do pessoal da organização e resistência dos doentes. 
     Contaram sobre o tratamento das crianças desnutridas, das doenças básicas que matavam muitos. 





     O setor da psicologia foi um dos mais interessantes, os desenhos das crianças,  de tantos cantos do mundo, denunciavam a violência que carregavam em suas almas. Algumas histórias contadas pela equipe, de tantas tristezas e mutilações da alma, nos traziam mais perto da dor deles...
Como falava de criança o Pedro prestou mais atenção aqui...



Não tive como não lembrar dos mortos de Lampedusa olhando esse desenho...

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     Ao final da exposição conhecíamos quem eram as pessoas verdadeiras referentes as identidades que havíamos recebido no início...

Mesmo sendo fotos, como não se emocionar com esses olhares?



     O Pedro e a Bia acompanharam tudo, mas, nessa altura do campeonato você deve estar pensando: que crianças nerds-maravilhosas-santas-que não existem são esses filhos da Silvana?

     Agora vem a parte B, rsrs. Estava um calor que só quem conhece o Rio de Janeiro sabe qual é, com um sol de rachar. Depois de um tempo as crianças começaram a reclamar do calor, e tal. Claro que eu aproveitei aquele papo de mãe chata para dizer: "imagina então se estivessem num campo de refugiados com um monte de outras pessoas e 45 graus?" Sadismo materno educativo né, rsrs.
     Em certa altura do campeonato começaram a pedir o celular para jogar, e obviamente eu não dei... Comecei a ficar com uma ponta de crise: será que vai ser mais traumático do que legal?
     Bem, depois das contradições, dos momentos de atenção e interesse por parte deles, e outros de tédio e chateação, acho que valeu a pena. Depois de tudo, quando perguntei, um tempo depois, sobre o que tinham achado, disseram que tinha sido legal... Então acho que valeu. 
Mas gente, nunca é um mar de rosas!! Ainda mais quando queremos que vivam coisas e referenciais de mundo diferentes...

     Mas ai começa, ou continua, a minha angústia. Os meus filhos, assim como os da maioria que conta a verdade (tem gente que adora idealizar os filhos não tem?) prefere passear no shopping, comprar brinquedos, jogar no tablet e todas as coisas que nós fazemos também! Mas achamos que não são suficientes e precisam de contrapontos. Entretanto é difícil tentar educar de um jeito diferente, tentar levá-los para outros caminhos e ideais que não sejam apenas o de "se dar bem", da meritocracia, e do EU gigante da pós-modernidade...
     Então a gente tenta, de um jeito e de outro. Eu me desespero ao pensar que na turma das crianças não tem criança negra por exemplo (ah, o Brasil é o país de todos não é mesmo?). Você já parou para pensar que, se não tomarmos cuidado, nossas crianças serão criadas em guetos, guetos da escola, do condomínio, do clube e não vão conhecer nem conviver como iguais com a diferença? Ah, e vou defender até o fim dos meus dias que isso é essencial para termos seres humanos realmente humanos.

     Na minha infância eu brinquei na rua, estudei em escola pública, convivi em comunidades religiosas onde havia do favelado ao dono da empresa. E tenho certeza que aprendi muito com isso. E quero que meus filhos aprendam também, mas hoje é mais difícil...
    Então tenho tentado, do jeito que dá, muito menos do que gostaria e acho que seria bom, proporcionar experiências e vivências com eles em direção ao outro.
     E esse post, mais do que tudo, é para fazer você pensar se não dá para fazer alguma coisa a mais também, que impacte as crianças a sua volta e mostre que o outro, mesmo diferente, é tão criança quanto seu filho, sobrinho, primo, e as vezes um gesto pode significar muito.
     
     Sempre que podemos fazer alguma atividade em comunidades carentes por aqui, as crianças são envolvidas, do jeito que der. A Bia sempre adora ajudar, seja nas maquiagens dos Dias da Beleza, ou ajudando na decoração. O Pedro fica zanzando no meio, mas sempre arranja ótimos amigos diferentes mas com o mesmo coração de criança nas nossas andanças...

Bia de palhacinha junto com voluntários ingleses numa atividade em uma favela da cidade

As crianças com os presentes de Natal e os grandes amigos recém descobertos do Pedro!!

Olha o Pedro me "ajudando" no teatro, rs

     De uns 4 anos pra cá, uma das coisas que fazemos é uma festa de Natal para uma escola de uma região carente da cidade. E tem sido tão, mas tão legal! Conseguir os presentes, planejar os detalhes, ter um monte de gente que se mobiliza para ajudar quando a gente começa a se desesperar. 

Massagens nos pés das meninas

Ajudando a montar tudo para festa do ano passado

     Ah, não pense que é festa da igreja, do centro espirita ou de alguma organização, não. Tivemos a ideia, chamei alguns alunos da universidade e agora aparecem amigos de diferentes lugares para ajudar. Ano passado conseguimos uns 150 brinquedos (nada de brinquedo de 1,99 não, se é para ajudar quem precisa meu lema é o melhor que pudermos!).
     E as crianças entram nessa junto. 
    Uma das coisas que mais me impactou no Natal passado foi a reação da Bia no início do planejamento. Ela anotou o número de crianças e começou a fazer as contas do montante de dinheiro que precisaríamos. Pensando em presentes entre 30 e 50 reais, mais toda a estrutura de lazer a alimentação, não era muito pouco. 
     Ai vem a pergunta dela: mãe, e se a gente não conseguir todo esse dinheiro??? Então eu busco, nos cantinhos do meu ser, toda fé possível e respondo: Bia, nós VAMOS conseguir. Quando a gente faz o bem, o amor ao próximo é algo sonhado por Deus para que esse mundo fosse diferente, então Ele sempre dá um jeito. 
     Uma semana antes da festa ainda faltava muita coisa e lá vem ela de novo: mãe, e agora,? E eu, na minha fé não tão grande assim respondo: nem que a gente pague bastante coisa Bia, no final Deus ajuda e a gente dá conta da dívida.
     Mas, para a surpresa dela, e minha também (a fé as vezes fraqueja, rsrs) conseguimos tantos presentes que sobraram, foram entregues para outras crianças e até pessoas carentes de outro bairro!! E a Bia ficou muito impactada com isso (e claro que eu também!!)
Era muito presente!! Graças a Deus!! Até o trabalho de embrulhar tudo é uma alegria pela conquista!

     Depois de tudo isso e do que ainda virá, tenho que acreditar que alguma coisa ficará no coração deles. Como mãe, tenho que tentar e acreditar, sempre...
Nesse Natal conseguimos um salão de festas emprestado, ai pudemos caprichar, com mesa posta e  guardanapos. E não sujaram nenhuma toalha, acreditam??

Painel com as fotos das crianças na primeira festa de Natal que fizemos

Por um bom motivo a gente "paga o mico" que aparecer, rsrs

Esperando o Papai Noel!!


     E quero deixar aqui um pequeno desafio. O que será que você poderia fazer aí, no seu bairro, na sua cidade, na escola da esquina, embaixo da ponte, no beco dos esquecidos?? Quem sabe nesse Natal também? Se você parar pra pensar e decidir fazer, quer apostar comigo que Ele vai te ajudar e você vai se surpreender?

     E quem sabe alguns daqui de perto,pais, mães, filhos, amigos não irão esse ano com a gente na nossa festa de Natal??
Ah, para não perder o hábito de exercitar a fé, estou pensando alto, ao invés de uma, tentar duas festas nesse ano!!!

Alguns poucos flashs, guardados pra sempre no meu e no coração de tantos, da nossa Festa de Natal do ano passado!!!

Teve até bolo do João e Maria!


Nosso Papai Noel!!

Tem coisa melhor do que ajudar a proporcionar esse sorriso????

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5 comentários:

  1. Silvana, muito legal tudo isso. Aqui retomo o que falei no início do mês, achando que essa festa era de Dia da Crianças: eu quero ajudar! Inclusive, conforme escrevi para você, estou cheia de brinquedos da Gigi para doar. Brinquedos pouquíssimos usados. Barbies em estado perfeito. Não estão na caixa, mas estão ótimas. Inicialmente, eu iria doar esses brinquedos para a creche local, mas depois pensei que eles estão tão bons que talvez fosse mais bacana doar cada um deles para UMA criança carente, daquelas que de repente sonham em ter uma Barbie para chamar de sua. :) Se vocês aceitarem esse tipo de doação, fala comigo que eu volto a mexer nos sacos ( a essa altura já está tudo misturado) e separo para festinha. Quero ajudar - sou péssima com decoração (hehehhehe), mas posso ajudar com a parte da comida e de servir as crianças. Conte conosco aqui, de verdade!!! Ricardo pode contribuir com fotos ou música. Gigi pode ajudar também. :) Diga-nos quando e daremos um jeito. :) Beijos

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    1. Eba!!!! A familia inteira já está contratada!!! Obrigada Mari, pela disposição e o coração para ajudar. Nao são atitudes muito comuns no nosso mundo pós- moderno. Bjs

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    2. Parafraseando uma mulher que admiro muito: "Tudo que eu falo é para ser levado à sério" (MAGALHÃES, SILVANA: 2013). :p

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  2. Maravilhoso Silvana! Pensei em como é difícil, muitas vezes, nós conseguirmos vincular nosso mundo real ao que é possível a cada um de nós como possibilidade de transformação sem nos colocar que não é responsabilidade nossa, que é do poder público, do legislativo, ... e a nossa responsabilidade de pais sobre a educação de nossos filhos? É nosso compromisso orientá-los sobre sua função social, sobre seu papel de cidadão que deve intervir sempre em benefício de seu meio. Penso que é assim que devemos agir, cada um à sua maneira, na sua comunidade, respeitando seu grupo, suas peculiaridades, mas atuando, sendo, fazendo... Abçs.

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    1. Acho que o desafio na atualidade é maior que nunca!! Num mundo num mundon onde tudo vira mercadoria, consumo e competição. Temos uma briga feia pela frente, rs. Mas vamos experimentando né Kelly, errando e acertando as vezes. Grande beijo

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